Monoteísmo Ancestral
Rabino Yehuda Halevi e “O Cuzarí”: Filosofia, Poesia e Defesa do Judaísmo.
Rabino Yehuda Halevi (c. 1085–1140) foi um filósofo, poeta e teólogo judeu medieval nascido em Toledo, Espanha. Reconhecido como um dos maiores pensadores judeus do período medieval, Halevi se destacou tanto por sua obra literária quanto por sua defesa filosófica do judaísmo frente a filosofias rivais, principalmente o cristianismo e o islamismo. Sua obra mais famosa, “O Cuzarí”, escrita originalmente em árabe e posteriormente traduzida para o hebraico, é um tratado filosófico estruturado em forma de diálogo que explora a natureza da fé, da revelação e do papel de Israel como povo da profecia.
O estudo a seguir aborda sua biografia, contexto histórico, estrutura da obra, principais ideias filosóficas e influência posterior.
O período em que Halevi viveu foi marcado por intensa interação cultural e religiosa na Península Ibérica, conhecida como Al-Andalus. Judeus, cristãos e muçulmanos conviviam em contextos muitas vezes pacíficos, mas também com tensões teológicas e políticas. Nesse cenário, filósofos judeus foram fortemente influenciados pelo pensamento aristotélico e pela filosofia islâmica, ao mesmo tempo em que buscavam afirmar a singularidade do judaísmo.
Diferente de pensadores como Maimônides (1135–1204), que buscou harmonizar filosofia e religião, Halevi enfatizou a superioridade da revelação judaica sobre a razão filosófica, argumentando que a experiência direta da revelação divina supera qualquer argumento filosófico.
Fontes confiáveis:
Kaplan, M. (2002). History of Jewish Philosophy. Oxford University Press.
Pines, S. (1986). Judah Halevi: The Kuzari. Cambridge University Press.
Halevi nasceu em uma família judia em Toledo, centro cultural e intelectual da Espanha medieval. Desde jovem destacou-se como poeta, compondo obras que combinavam fervor religioso e estética literária. Entre suas obras poéticas, destacam-se as “Canções de Tsión”, que expressam amor pela Terra Santa e fervor religioso.
No final de sua vida, Halevi realizou uma peregrinação a Jerusalém, motivado por sua devoção religiosa, onde, segundo relatos, morreu próximo às muralhas da cidade. Sua biografia demonstra a fusão entre vida pessoal, experiência espiritual e expressão literária, característica marcante de sua filosofia.
Fontes confiáveis:
Langermann, Y. T. (1999). Judah Halevi and His Thought. Brill Academic Publishers.
“O Cuzarí” é uma obra filosófico-religiosa estruturada em forma de diálogo entre o rei dos cazáres (uma tribo do Volga) e um sábio judeu. O rei busca identificar a religião mais verdadeira, convocando representantes de várias religiões. Cada representante critica o judaísmo, até que o sábio judeu apresenta uma defesa detalhada.
A obra possui várias características notáveis:
Didática: Estruturada passo a passo para conduzir o leitor à compreensão da superioridade do judaísmo.
Diálogo filosófico: Metodologia semelhante à tradição socrática, combinada com referências à filosofia aristotélica e à revelação bíblica.
Integração de poesia e filosofia: Halevi utiliza elementos poéticos para expressar conceitos espirituais complexos.
Fontes confiáveis:
Halevi, J. (2005). The Kuzari: In Defense of the Despised Faith. Yale University Press.
Halevi distingue o Deus da filosofia (Aristóteles) do Deus da revelação (Abraão). Para ele, a filosofia pode demonstrar a existência de um ser supremo, mas não pode criar uma ligação íntima entre o homem e Deus. Essa ligação só é possível pela revelação direta, exemplificada na experiência do Monte Sinai.
“O mais que a filosofia podia fazer era apresentar provas convincentes da existência de um deus, um dirigente, um organizador do mundo. Mas tudo isto não toca na borda da religião, que insiste na existência de uma íntima ligação entre homem e Deus.”
Halevi argumenta que Israel possui uma faculdade divina especial, herdada através de uma cadeia de indivíduos escolhidos, começando em Adão e passando pelos patriarcas. Esta faculdade profética permite uma comunicação direta com Deus, algo que nenhuma outra nação possui em igual intensidade.
A Torá, a Terra Santa e o hebraico são considerados instrumentos sacramentais que potencializam a atividade do espírito profético:
Torá: Canal para energias espirituais, regula a experiência religiosa.
Terra Santa: Ambiente que favorece a sabedoria e a espiritualidade.
Língua hebraica: Meio ideal de expressão espiritual e comunicação profética.
Embora destaque Israel como privilegiado espiritualmente, Halevi também apresenta uma visão universalista: outras nações podem se elevar espiritualmente, mas Israel representa a raiz moral e espiritual do mundo, sendo o “coração das nações”.
6. Contribuições Literárias e Poéticas
Além do Cuzarí, Halevi é renomado por suas obras poéticas, especialmente as Canções de Tsión, usadas até hoje em cerimônias judaicas. Sua poesia combina fervor religioso, patriotismo e misticismo, evidenciando sua visão de que o amor por Deus e pela Terra Santa é inseparável da vida prática e espiritual do judeu.
Fonte confiável:
Schirmann, J. (1990). Hebrew Poetry from Spain. Jewish Publication Society.
Halevi influenciou profundamente o judaísmo medieval e moderno:
Seus escritos filosóficos inspiraram debates sobre a relação entre fé e razão.
A valorização da experiência revelatória influenciou movimentos místicos e litúrgicos.
Poeticamente, seu estilo moldou a tradição litúrgica sefardita.
Ele é frequentemente estudado em conjunto com outros pensadores medievais, como Maimônides (racionalista) e Rabino Abraham Ibn Ezra (intelectual poético), destacando o equilíbrio entre razão, fé e arte.
Rabino Yehuda Halevi representa a síntese de poesia, filosofia e devoção religiosa. Por meio do Cuzarí, ele defendeu o judaísmo como religião revelada e espiritualmente superior, sem desprezar a racionalidade, mas colocando a revelação no centro da experiência religiosa. Sua obra permanece um marco no pensamento judaico, oferecendo insights sobre fé, identidade e experiência profética que continuam a influenciar estudiosos e praticantes.
Halevi, J. (2005). The Kuzari: In Defense of the Despised Faith. Yale University Press.
Kaplan, M. (2002). History of Jewish Philosophy. Oxford University Press.
Pines, S. (1986). Judah Halevi: The Kuzari. Cambridge University Press.
Langermann, Y. T. (1999). Judah Halevi and His Thought. Brill Academic Publishers.
Schirmann, J. (1990). Hebrew Poetry from Spain. Jewish Publication Society.